Peixes Montanheses
- andre hermeto
- 1 de nov. de 2023
- 16 min de leitura
Atualizado: 16 de nov. de 2023
Quem são os atletas que revolucionaram e inspiraram a natação em Belo Horizonte
Classificar atletas e conquistas esportivas pode ser uma tarefa extremamente subjetiva. Em seu livro “80 anos de história da natação brasileira”, o ex-presidente da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos, Renato Cordani, simplificou um pouco a tarefa ao criar um critério básico. No mundo da natação existe uma hierarquia quando discutimos as maiores glórias a serem atingidas por um atleta. O ouro olímpico se encontra, indubitavelmente, no topo da pirâmide, seguido pela prata e pelo bronze. A lista é sucedida pelas medalhas nos mundiais de piscina longa (50 metros) realizados pela FINA (Federação Internacional de Natação), e por último, estão os recordes mundiais.
Baseado nesse modelo, Cordani elenca as principais conquistas da natação brasileira de forma cronológica, totalizando 39 feitos que se enquadram nos critérios citados, obtidas por 24 nadadores entre 1939 e 2019. Após o lançamento do livro, podemos incluir ainda as medalhas olímpicas de prata de Bruno Fratus, nos 50m livre, e o bronze de Fernando Scheffer, nos 200m livre, conquistadas durante as Olimpíadas de Tóquio em 2021. Já no mundial de Budapeste, no ano seguinte, Guilherme Costa conquistou o bronze nos 400m livre.
Seguir uma tabela clara e objetiva pode ser a melhor forma de definir as principais conquistas de um país no esporte, mas não ajuda a definir a importância completa de um atleta para o crescimento de seu esporte em um clube, ou em uma cidade. A natação em Belo Horizonte evoluiu de forma gradual ao longo dos anos, e o papel de seus nadadores nessa trajetória passa por conquistas nas categorias de base, vagas e pódios olímpicos e a identificação com os clubes da cidade. Dessa forma, os atletas tratados nessa matéria seguem critérios mais subjetivos do que uma hierarquia de conquistas pessoais, podendo sim, muitas vezes, estar sujeitos ao viés de noticiabilidade e documentação de um determinado nadador ou período. No entanto, a apuração aqui feita, englobando todo o período desde a fundação do Minas Tênis Clube, em 1935, é capaz de compreender e classificar, até certo ponto, a importância de atletas para o desenvolvimento e divulgação da natação na capital mineira, por meio de conquistas, longevidade e relação com a cidade e seus clubes. Abaixo, conheça um pouco da história desses atletas.
SIEGLINDA LENK (1919 – 1986)

Quando o Minas Tênis Clube foi inaugurado, em 1937, o nome escolhido para comandar o novo programa de natação que se iniciava foi Carlos Campos Sobrinho. O ex-técnico da Federação Paulista de Natação e da Seleção Brasileira nos Jogos Olímpicos de Berlim, chegou a Belo Horizonte com a liberdade que buscava para desenvolver atletas desde a juventude. Seu foco não era de trabalhar com nadadores adultos e já formados, mas sim construir uma base que pudesse se tornar vencedora no futuro.
Mas para despertar a ambição de jovens desde cedo, a inspiração por meio de exemplos já consagrados era essencial. E para isso, Carlito trouxe para a natação do Minas a atleta olímpica Sieglinda Lenk, quem havia treinado para as Olimpíadas de 1936. Irmã da famosa Maria Lenk, primeira atleta brasileira a bater um recorde mundial no esporte, Sieglinda também acumulou uma carreira de conquistas.
Nascida em São Paulo, em 18 de dezembro de 1919, ela iniciou sua carreira no clube alemão Estrela e, posteriormente, foi para a Associação Atlética São Paulo – AASP. Apesar de a prática de esportes não ser comum para mulheres na época, as irmãs Lenk foram incentivadas desde cedo por seus pais a desempenharem atividades físicas. Sieglinda participou da edição dos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936, na Alemanha, onde competiu nos 100 metros costas. No mesmo ano, foi a vencedora da tradicional Travessia de São Paulo a Nado. Já no Minas, dois anos mais tarde, em 1938, ela repetiu o feito, marcando assim a primeira grande vitória do clube em eventos competitivos de natação. Em sua primeira temporada no clube, ela marcou 62,5 pontos em competições oficiais, quase o dobro do segundo atleta na lista.

Suas marcas pelo Minas representam o início da trajetória de um dos mais tradicionais clubes do Brasil na atualidade, e de todo o esporte na capital belorizontina. Sieglinda ganhou as duas primeiras provas individuais de Minas Gerais em campeonatos brasileiros, quando foi medalhista de ouro nos 100m e 200m costas no campeonato brasileiro de 1938; e conquistou o primeiro recorde sul-americano por um atleta de clube mineiro, em 1939. Esses feitos são expostos no Acervo do Minas Tênis Clube, bem como inúmeras menções a importância de Sieglinda e Carlito para a natação belorizontina.
“Dentre todos aqueles que muito se esforçaram pelo engrandecimento do esporte aquático, dois se destacam por uma obra cujo valor será histórico: Carlos Campos Sobrinho e Sieglinda Lenk ... A apresentação da coesa equipe infanto-juvenil mineira, nada mais é que o resultado do esforço dessas duas figuras populares de nossa natação.” – lê-se no Folheto referente ao Campeonato Brasileiro de 1940.
Quando deixou o MTC, em 1940, para defender as cores do Fluminense, ela era detentora de seis recordes individuais do clube, e havia construído, em sua curta passagem, um legado duradouro. Sua presença e suas conquistas, como atleta olímpica, campeã brasileira e recordista sul-americana, foram fatores cruciais para o despertar da paixão pelo esporte na juventude de Belo Horizonte.
SÂNZIO VALLE MENDES (1927 - 2010)

Diretor e fundador da unidade II do Minas Tênis Clube (MTC), empresário e a primeira grande estrela da base da natação do Minas, Sânzio Valle Mendes foi uma figura cuja importância para a natação belorizontina extrapola as conquistas nas piscinas. Filho de José Mendes Júnior, um dos fundadores do Minas e da Federação Aquática Mineira (FAM), Sânzio cresceu em uma Belo Horizonte tomada pelos ideais instaurados pelo Estado Novo, e tão disseminados pela elite que se consolidava. Seu pai, assim como os outros fundadores, acreditava no poder disciplinário do esporte sobre a juventude, como é contado na biografia de Sânzio, “Campeão de Desafios”. Foi ele quem trouxe Carlos Campos Sobrinho (Carlito) para desenvolver o programa de natação no novo clube da capital mineira.
José Mendes Júnior (1900 – 1983) nasceu em Juiz de Fora e se formou em Engenharia na universidade local, em 1921. Antes de fundar uma das principais construtoras do Brasil, a Mendes Júnior, o empresário construiu carreira na vida pública, passando por projetos como a Estrada de Ferro Central do Brasil, e pela Secretaria de Agricultura e Viação de Minas Gerais. Sua estreita relação com o aparelho do Estado-empresa, intensificado na Era Vargas, foi um dos fatores contribuintes para o auxílio do governo mineiro na construção do Minas Tênis Clube. Sânzio, eventualmente seguiria os passos de seu pai e se tornaria engenheiro e gestor; mas, durante sua infância, a natação se tornou sua grande paixão.
Apesar das convicções de seu pai em relação a prática esportiva, a decisão de começar a nadar partiu do próprio garoto. Sempre presente no dia a dia das obras do MTC, Sânzio viu um dos primeiros diretores do clube, de terno e tudo, cair na piscina que estava sendo testada, exatamente na parte mais funda. Sem saber nadar, o homem teve que ser socorrido por pessoas presentes no local. Vendo tudo isso, Sânzio conta, no livro “Campeão de Desafios”, que resolveu aprender a nadar.
Ainda sem a piscina do clube fundado por seu pai em funcionamento, Sânzio, sendo atleticano, foi treinar no Clube Atlético Mineiro, onde aprendeu os fundamentos básicos e os diferentes estilos oferecidos pelo esporte. A piscina do Galo se localizava onde hoje está o Diamond Mall, era consideravelmente menor que a piscina do MTC que seria inaugurada e não contava com azulejos, sendo toda cimentada. Uma vez inaugurada a praça de esportes do novo clube de seu pai, com uma piscina maior e mais bonita, o garoto de ainda 10 anos não hesitou em trocar de clube.

No primeiro campeonato brasileiro infanto-juvenil, em 1939, Sânzio liderou a equipe de base do Minas ao título. O garoto, de apenas 11 anos, foi ouro nos 100m costas e na prova que se tornaria sua especialidade, os 100m livre; nessa última, considerada a prova nobre da natação, Sânzio venceu o segundo colocado por uma diferença de quatro segundos, o que pode ser considerado uma infinidade nesse tipo de prova, até mesmo nas categorias de base. Para efeitos de comparação, nas finais Olímpicas de 2021 em Tóquio, a diferença entre o primeiro e segundo colocado nessa prova, foi de 0.06 segundos, enquanto a diferença do primeiro para o oitavo foi 1.08 segundos. Claro que estamos falando de uma competição mundial de atletas profissionais, mas de qualquer forma, a diferença imposta por Sânzio, já com pouca idade, em um campeonato brasileiro, evidenciava sua dominância nas categorias de base brasileira.
Em uma equipe focada no desenvolvimento da juventude, composta por outros destaques, como Danillo Magnavacca, Ada Áurea de Campos, Ângelo Paolucci, Mauro Quintino e outros, Sânzio era o principal nadador da base minas-tenista. Em 1940 e 41, ele defendeu sua hegemonia nas duas provas conquistadas em 1939, e repetiu o ouro em ambas, quebrando os recordes de categoria em todos os três anos.
Nessa mesma época, o paulista Willy Otto Jordan, maior nadador brasileiro da época, já na casa dos 20 anos, dominava as competições brasileiras absolutas (para todas as idades). Em 1940 e 44, Willy compartilhou com Maria Lenk e Piedade Coutinho a frustração de não poder competir nas Olimpíadas devido a Segunda Guerra Mundial. Em 1948, nos Jogos de Londres, ele se tornou o primeiro homem brasileiro a nadar em um final olímpica, ficando em sexto lugar nos 200m peito. Ele foi também o primeiro brasileiro a quebrar a marca de 1 minuto nos 100m livre.
Em 1944, no auge de sua carreira na natação, e em seu último ano como atleta antes de seguir os passos do pai na engenharia, Sânzio nada seu primeiro campeonato brasileiro absoluto. Com apenas 16 anos, e o recorde mineiro de 1’02’’77 (1 minuto, 2 segundos e 77 centésimos), a expectativa era de que Sânzio pudesse desbancar o maior nadador brasileiro da época, Willy Otto Jordan, que já detinha o recorde brasileiro de 59’’70 (59 segundos e 70 centésimos). Sânzio terminou a competição em 3º colocado, piorando sua melhor marca pessoal em 2 segundos.
Apesar da presença de nadadores na equipe do Minas que se sagraram campeões no brasileiro daquele ano, os feitos de Sânzio, em uma idade tão jovem, personificam o trabalho de Carlos Campos Sobrinho em desenvolver a base do clube, além de nos deixar pensando em o que mais esse nadador poderia ter alcançado caso não tivesse parado de nadar com apenas 17 anos de idade. E é por isso que Sânzio conquistou um lugar nessa lista.
FERNANDO PAVAN (1932 – 2019)

Não há muito a ser discutido aqui. Fernando Pavan é o primeiro nadador belorizontino a conquistar o tão almejado sonho olímpico. Pavan vivenciou todo o processo evolutivo da natação na capital mineira, iniciando suas conquistas na base do América Futebol Clube, onde, na categoria petiz, já se destacava nas provas do nado de peito.
Entre 1940 e 1942, o nadador olímpico acumulou recordes de categoria nos 50m peito pelo alviverde, até que se mudou para o Minas Tênis Clube, em 1943. Foi ainda jovem, sob o comando do técnico Litz Tessarolo, que Fernando Pavan começou a se destacar no estilo que o tornou um atleta olímpico, o nado de costas. De acordo com artigos no Acervo do MTC, uma das determinações de Tessarolo como técnico era desenvolver diferentes modalidades nos atletas ainda jovens. Como de costume até os dias atuais, treinadores da base se deparam constantemente com tentativas intervencionistas de familiares em seu trabalho. À família Pavan, não agradou o fato de Fernando estar aos poucos se tornando um especialistas no nado de costas, argumentando que suas melhores performances ainda viriam nas provas de peito. Tendo em vista a influência da família no clube, esse desentendimento, levou à saída de Tessarolo do comando da equipe. Seu trabalho, no entanto, foi eternizado na vaga olímpica conquistada por Fernando Pavan três anos mais tarde, quando o atleta cravou um lugar nos Jogos de Helsinque, por meio da prova dos 100m costas.
“Os Jogos Olímpicos eram desconhecidos do grande público. Muita gente chegava a dizer que eram bobagem. Mas quem lidava com o esporte sabia o seu significado. Eu queria ir.”, conta Pavan, em entrevista concedida ao SuperEsportes, em 2016.
Com o objetivo em mente, e o posto de um dos melhores nadadores brasileiros em sua prova, Pavan se deslocou ao Rio de Janeiro para realizar a “Tentativa Olímpica de Natação”, no Clube Guanabara de Remo. Ele pôde tentar a marca três vezes e acabou indo mal nas duas primeiras. O tempo necessário era de 1’08”05, atingido por um nadador carioca; para assegurar sua vaga, Pavan devia bater o tempo. Na terceira tentativa, o minas-tenista completou a prova em 1’08”01.
A vaga parecia assegurada, e Pavan nem voltou a Belo Horizonte, permaneceu no Rio treinando com a equipe que viajaria para a Finlândia no meio do mês de julho, de 1952. No dia 1º de julho, o jornal Folha de Minas noticiou a decisão da Confederação Brasileira de Desportos e do Comitê Olímpico Nacional em cortar o nadador da equipe, alegando falta de verbas. No mesmo dia, o gerente do MTC, Otto Gomes Nogueira, viajou ao Rio de Janeiro afim de reverter a situação. O que quer que tenha sido dito foi suficiente para convencer as entidades a mudarem de ideia e, no dia seguinte, Fernado Pavan foi oficializado como membro da delegação olímpica.
Pavan chegou até as semifinais em sua prova e acabou não se classificando para as finais, ficando em 6º na sua semifinal e em 13º lugar geral, de acordo com o site oficial das Olimpíadas. Após a competição, ele trocou a natação pelo vôlei, onde também se destacou e integrou seleções brasileiras durante a década de 1950. Na década de 1980, ainda se tornou diretor de vôlei minas-tenista, conquistando o tricampeonato brasileiro entre 1984-86. Figura multiatleta, Fernando Pavan poderia facilmente figurar em uma lista dos maiores atletas belorizontinos. Durante sua infância ainda foi destaque em competições de atletismo, na modalidade do salto em altura, e jogou basquete pelo América. Na natação, a quebra de barreira ao conquistar a vaga olímpica, recordes e títulos nas categorias de base e absoluta, o credenciam como um dos maiores nadadores da capital mineira.

MARCUS MATTIOLI (1960 - )

Quem frequenta a piscina olímpica do Minas Tênis Clube hoje em dia, muito provavelmente já se deparou com o primeiro medalhista olímpico da história de Belo Horizonte, e de Minas Gerais. Aos 63 anos, Marcus Mattioli ainda acumula horas e quilômetros de treino diariamente, sendo um dos principais nadadores da categoria master (categoria para atletas acima de 25 anos e não profissionais) no mundo. Mattioli nasceu em BH, em 1960, e começou a nadar aos três anos de idade. A primeira influência da natação em sua vida foi dentro da própria família. Com três irmãos mais velhos, todos nadadores, Mattioli foi quem mais se destacou no esporte. Afinal de contas, poucos atletas conquistaram tanto quanto ele. Já na categoria mini-mirim (até oito anos) ele ganhava sua primeira medalha, até que o costume do pódio culminou na tão almejada medalha olímpica. Até hoje, apenas três nadadores conquistaram esse feito nadando pelas cores de clubes belorizontinos ou mineiros; e Mattioli é o único de fato nascido em BH. Em 1976, um dos primeiros relatos de suas conquistas, na revista oficial do Minas, já relatava sua vitória nos 200m e 800m livre no Torneio Carioca de Aspirantes, no qual o MTC foi convidado a participar. A partir daí, as conquistas se tornaram nacionais, continentais e, enfim, globais. Em 1979, Mattioli derrotou um dos maiores nomes da natação brasileira de todos os tempos, Djan Madruga, na prova dos 200m medley (modalidade em que o nadador pratica os quatro estilos da natação) no Troféu Brasil (atual Maria Lenk). Como comentado pelo seu técnico, Amauri Machado, a vitória foi um marco para a natação mineira, que não tinha um campeão brasileiro há muito tempo. Djan Madruga bateu na trave da conquista da medalha olímpica individual três vezes, finalizando em 4º colocado duas vezes nos 400m livre e uma vez nos 1.500m livre, até que conquistou seu bronze na prova de revezamento 4x200m livre em 1980, dividindo o pódio com seu rival Mattioli. Chegando em Moscou, a equipe de revezamento brasileira detinha o 16º tempo do mundo, de acordo com a Associação Brasileira de Masters de Natação. Os americanos vinham de uma sequência de cinco ouros seguidos na prova. No entanto, devido a um boicote realizado pelos americanos à competição, devido a realização em território soviético e a invasão do Afeganistão um ano antes, o topo do pódio poderia ter um novo dono. O Brasil havia sido vice-campeão pan americano da prova um ano antes, derrotando o time do Canadá, feito esse que jamais havia acontecido. O time de Moscou era exatamente o mesmo, com Jorge Fernandes, Marcus Mattioli, Cyro Delgado e Djan Madruga. A possibilidade de medalha virou uma obsessão para os brasileiros. Os quatro fizeram uma temporada de treinamentos intensos nos Estados Unidos (Mattioli em Indiana e os outros três em Mission Viejo). Treinamentos mais desgastantes do que aqueles praticados no Brasil, além de exercícios fora da água e psicológicos credenciaram os brasileiros para chances reais de medalhas quando chegaram em Moscou.
A equipe brasileira melhorou consideravelmente seu tempo realizado no pan de 1979, saindo de 7:38.92 para a marca de 7:29.30 na final olímpica. À frente dos canarinhos, ficaram a União Soviética, com 7:23.50 em primeiro lugar, e a Alemanha Oriental, com 7:28.60, em segundo. No entanto, escândalos de uso de substâncias ilegais que vieram à tona recentemente (e inclusive trouxeram sanções a atletas russos) fortaleceram o caso do revezamento brasileiro ter a medalha de ouro reconhecida pelo Comitê Olímpico Internacional (COI). Há algum tempo, os quatro medalhistas começaram a se mobilizar nesta batalha, após evidências surgirem de que a equipe da Alemanha Oriental e seus técnicos aplicavam esteroides anabolizantes nos atletas. Um dos atletas da equipe, Frank Pfütze, morreu de insuficiência cardíaca súbita, em 1991, com apenas 32 anos de idade. De acordo com matéria no canal “Agência Brasil”, em 2016, tramitava um processo na Justiça alemã, aberto pela sua família, que acusa o governo de ser o responsável pela morte, e que Frank teria sido induzido a usar uma alta quantidade de substâncias proibidas.
Em entrevista concedida ao canal, Mattioli ressalta que a equipe Soviética também contava com indícios do uso de substância. A matéria conta que um membro da Comissão de Doping da Alemanha, Steven Selthoffer, em consulta feita pelos brasileiros, admitiu a possibilidade de doping da equipe alemã naquele ano e acrescentou que os soviéticos também possuíam um esquema semelhante.
"Os países do Leste europeu adotavam uma política de promover os governos através do esporte e, para isso, se valiam de doping", disse Mattioli. Ouro, prata ou bronze, a medalha de Mattioli marcou talvez o maior legado da história da natação belorizontina. Como diria Renato Cordani em seu livro, medalhas olímpicas são eternas. Veja o vídeo abaixo, que narra a conquista dos brasileiros:
Mas a contribuição de Mattioli para o esporte e para a cidade não parou em Moscou. Apesar de não ter se classificado para futuros Jogos Olímpicos, ele liderou a equipe minas-tenista ao longo da década de 1980. Em 1988, foi o grande líder da equipe que conquistou a dobradinha dos campeonatos brasileiros de verão e inverno, o Troféu Brasil e o Trófeu José Finkel. Hoje, Mattioli acumula vitórias na categoria master, além de ser professor de natação para crianças. Em 2018, ele foi incluído no Hall da Fama Internacional da Natação Master, fazendo companhia à até então solitária Maria Lenk. Com uma honra reservada a poucos atletas, Mattioli foi eternizado mais uma vez na história da natação. Logo após conquistar os campeonatos brasileiros de 88, Mattioli transacionou da natação competitiva para o master. No campeonato mundial da Federação Internacional de Esportes Aquáticos (FINA) do mesmo ano, ele bateu seis recordes mundiais de categoria. Largou a natação depois da competição e, após um hiato de 16 anos longe das piscinas e com 35 quilos a mais, ele voltou a competir em busca de um estilo de vida mais saudável, se tornando um dos maiores atletas masters de natação do mundo. O site oficial do Hall da Fama Internacional de Natação estampa suas conquistas, que, até 2018, incluíam 29 medalhas de ouro e 4 de prata em Mundiais Master da FINA, 14 recordes mundiais e 15 anos consecutivos na lista dos 10 melhores nadadores master do mundo.

ROGÉRIO ROMERO (1969 - )

Entre todos nadadores da história da natação de Belo Horizonte, o currículo mais recheado talvez seja o de Rogério Romero. A única comparação possível seria Thiago Pereira, que ainda será citado por aqui. Desde o início dos Jogos Olímpicos da modernidade, em 1896, na Grécia, apenas 861 atletas conseguiram o feito de competir em cinco edições do evento. Isso corresponde a 0,00001% da população mundial atual. Quando consideramos apenas nadadores, o número cai para 29 atletas, de acordo com levantamento estatístico do site Olympedia. Rogério foi simplesmente o primeiro a conquistar esse feito, junto com a dinamarquesa Mette Jacobsen, e a britânica Alison Sheppard.
No site oficial do ex-nadador, suas conquistas são destacadas, incluindo as cinco participações em Olimpíadas já citadas, ouro nos Pan-Americanos de Havana em 1991 e Santo Domingo em 2003, recorde mundial master nos 200m costas, 29 recordes sul-americanos, 41 recordes brasileiros, 15 vezes campeão do Troféu Brasil, 10 vezes campeão sul-americano, e 10 participações em campeonatos mundiais de natação.
Apesar de não ter começado sua carreira de natação em Belo Horizonte, a identificação criada com a cidade e o Minas Tênis Clube, o levou a seguir uma trajetória em cargos importantes para o esporte mineiro após sua aposentadoria. Foi subsecretário de esportes do estado de Minas Gerais entre 2004-06, evoluindo para secretário adjunto entre 2007-14, até ocupar seu cargo atual em 2015, como gerente de esportes do MTC.
Nascido em Londrina, em 1969, Rogério começou a nadar aos cinco anos de idade na Associação Cultural e Esportiva de Londrina (ACEL), onde nadou por mais de 11 anos, até se juntar ao Clube Golfinho, no início de 1986. O clube, fundado em 1975, era exclusivo para natação, e formou grandes atletas ao longo da história. Foi onde Rogério, junto ao técnico Reinaldo Dias, conquistou seus primeiros títulos de campeão brasileiro e sua primeira vaga olímpica, para os Jogos de Seul, em 1988.
Quando Reinaldo Dias foi anunciado como o novo técnico do Minas, em 1989, Rogério foi convidado a integrar a equipe do Minas, mas decidiu na época que preferia continuar em Londrina. Apenas em 1991, Reinaldo conseguiu trazer os talentos do sulista para as montanhas de Minas Gerais. Ele comenta que ao chegar no MTC, a infraestrutura e equipe multidisciplinar diferenciadas contribuíram para que evoluísse ainda mais como atleta.
“O Minas sempre está na vanguarda de programas de ciência do esporte, psicologia e tudo de mais moderno … Um exemplo mais atualizado, sobre a questão de psicologia do esporte, nós estamos hoje com uma parceria de mais de três anos com um consultor da UFMG, que é membro da associação mundial de psicologia do esporte.” - conta Rogério sobre o diferencial do clube, que percebe hoje como gerente de esportes, assim como percebeu em 1991, quando optou por vir treinar em Belo Horizonte.
No início de 91, já como membro da equipe minas-tenista, ele foi campeão pan-americano na edição de Havana, em Cuba, quebrando seu próprio recorde sul-americano, abaixando em quase um segundo sua marca estabelecida em Seul, três anos antes. No ano seguinte, cravou sua primeira vaga olímpica nadando pelo Minas, para as Olimpíadas de 1992, em Barcelona, ficando em 10º lugar na sua especialidade, os 200m costas, e em 21º lugar, nos 100m costas.
